Introdução
Durante muito tempo acreditou-se que a informação que passava nos media era recebida e interpretada da mesma forma por todos aqueles que estavam a assistir, deste conceito surgiu uma teoria no início do Sec. XX que ficou conhecida como Teoria da Bala Mágica.
Esta teoria rapidamente se provou retrógrada e inverídica, tendo uns anos mais tarde se provado que a comunicação era feita em dois sentidos; surgiu assim a Teoria Two Step Flow of Communication. Esta era caracterizada por um envolvimento maior entre o emissor e o recetor, passou-se a acreditar que ao receber a mensagem o ouvinte tirava as suas próprias conclusões, conclusões estas que poderiam ser diferentes de indivíduo para indivíduo, e para além disso dava um Feedback ao emissor.
A partir da Teoria Two Step Flow of Communication surgiram muitas outras ao longo dos tempos, sendo que se tomou como dado adquirido que a comunicação era feita em dois sentidos e não só em um.
Foi no ano de 1947 que surgiu a Teoria do Gatekeeping, uma teoria que se apresentou como revolucionária e que perdura até aos dias de hoje. A palavra Gatekeeping nada mais é do que a junção das palavras “gate”, que se traduz por “portão”, e “keeping” que se traduz por “guardar”, fazendo assim a palavra “gatekeeping” que no seu sentido metafórico se pode traduzir para algo como “Guardar o Portão”.
Esta teoria vem-nos dizer que os media têm o papel de gatekeepers e a sua função é filtrar a informação que circula, verificar a sua veracidade e só aí então apresentá-la ao público. Para facilitar podemos pensar no “gate” como a informação que é apresentada ao público, e a parte da verificação e validação dessa mesma informação para depois ser feita uma filtragem para decidir o que é ou não é passado no ar pode ser entendido como o “keeping”.
Na sociedade do Sec. XX em que as pessoas eram mais facilmente iludidas e acreditavam em tudo o que passava na televisão, este papel era fundamental. Porém numa altura em que as Fake News são cada vez mais frequentes e que as Redes Sociais estão a ganhar terreno em comparação com os media tradicionais este papel é absolutamente necessário também para a sociedade atual, pois estas mostram-se como um sítio onde a filtragem e validação da informação nem sempre é realizada.
Neste trabalho pretendemos desenvolver e explicar mais aprofundadamente o que é de facto a teoria do Gatekeeping, como ela surgiu e como evoluiu ao longo dos tempos, para isso recorremos à análise de diversos artigos e estudos realizados anteriormente de modo a que a nossa precisão esteja o mais fundamentada quanto possível; Pretendemos ainda abordar o tópico de Newsmaking recorrendo às mesmas estratégias.
- Gatekeeping
A teoria do Gatekeeping surgiu em 1947 por Kurt Lewin, que, ao se aperceber que os hábitos alimentares e as atividades de lazer eram diferentes de família para família, decidiu estudar o porquê de tal fenômeno tendo por base a perspectiva psicológica (Barzilai-Nahon, 2009). Barzilai-Nahon no seu livro Theories of Information Behaviour de 2005 define Gatekeeping como um processo de controlo de informações. Já Pamela J. Shoemaker e Timothy Vos dizem que muitas pessoas veem o Gatekeeping como “uma metáfora para descrever como as ‘notícias’ são descobertas e selecionadas pela mídia” e afirmam que essa visão é imprecisa no seu livro Gatekeeping Theory. Cada pessoa tem a sua própria definição de valor de notícia e isso faz com que o conteúdo que é transmitido seja diferente e de diferente forma dependendo de quem o está a transmitir (Shoemaker e Vos, 2005). Mais tarde em 2009 Shoemaker e Vos desenvolvem a sua definição e acrescentam que “A teoria do gatekeeping examina o fluxo de informações da mídia para o público”, afirmam ainda que “os gatekeepers atuam como mediadores estabelecendo o que é informação importante e digna de ser transformada em mensagem pública”, concluem dizendo que “os gatekeepers contribuem para a construção dos indivíduos na realidade social e da sua visão do mundo” (Shoemaker e Vos, 2009).
A base de todas as mensagens é a informação que para chegar ao público passa antes por um conjunto de “portas” que a filtram e fazem a sua seleção e divulgação de acordo com critérios predefinidos (Shoemaker e Vos, 2005). Nem todas as informações têm a mesma chance de passar pela primeira das “portas” e a ordem pela qual os conteúdos aparecem no jornal, a duração de cada notícia na televisão, o local onde as notícias são colocadas (se na internet, se no fim ou início do jornal, etc.), tudo isso é resultado da filtragem feita anteriormente (Shoemaker e Vos, 2005). Um exemplo simples dado por Shoemaker e Vos na sua obra Gatekeeping Theory é o das doenças e de como os diagnósticos médicos só chegam aos meios de comunicação caso o indivíduo seja alguém bem posicionado na sociedade, influente ou com estatuto elevado (Shoemaker e Vos, 2005). Kurt Lewin, criador da Teoria do Gatekeeping, nas suas pesquisas verificou que o processo de filtragem sucessiva pode ser aplicado a diversos casos da sociedade, sendo que a sua pesquisa mais famosa foi utilizando donas de casa e verificando que também elas tinham um papel um pouco semelhante ao de gatekeepers, na medida em que primeiro selecionavam o que iam preparar de jantar, em seguida que tipo de ingredientes e de onde os iam buscar, em seguida a forma de cozinhar, chegando eventualmente ao resultado final que seria indesejado ou desejado dependendo de a quem fosse servido (Barzilai-Nahon, 2009).
A globalização e o surgimento da Internet vieram complicar o processo de Gatekeeping uma vez que “os gatekeepers dependem das informações demográficas do público para controlar o fluxo de informações através dos portões” e, naturalmente, com a diversidade de pessoas a aceder às redes constantemente, este processo de mudança nas audiências complicou o movimento de passagem das informações por entre as “portas” do gatekeeping (Shoemaker e Vos, 2009).
Os Gatekeepers fazem o seu próprio juízo de valor na informação, e é exatamente isso que lhes permite selecionar a informação, sendo que tudo o que lhes possa ser prejudicial para a sua imagem é, naturalmente, eliminado (Barzilai-Nahon, 2006). Sendo assim Barzilai-Nahon (2006) enuncia “oito critérios principais do Gatekeeping, que, de certa forma, se relacionam todos entre si e que incitam à filtragem de conteúdos”, e são eles:
- Violação da Cultura Comunitária, este critério define-se por práticas que “podem pôr em risco o nível de compromisso que o utilizador tem para com a página da marca” e dá o exemplo de “comentários de outras marcas ou de outros utilizadores que incitem o próprio utilizador a deixar a página em que está e ir visitar outras páginas de marcas ou de produtos” (Barzilai-Nahon, 2006).
- Conteúdos Irrelevantes, tratam-se de “todos os conteúdos que não se relacionam de forma alguma com o tema central da página” (Barzilai-Nahon, 2006).
- Informação Comercial, trata-se da “publicação de conteúdos comerciais que tenham como objetivo a sua própria promoção e que não se relacionam de forma alguma com a marca ou com o utilizador detentor da página” (Barzilai-Nahon, 2006).
- Proteção dos Limites Comunitários, a autora explica isto como “cada página tem as suas regras e os seus limites relativamente aos conteúdos, como tal, conteúdos que não respeitem esses limites serão imediatamente eliminados” e dá o exemplo de comentários ofensivos e impróprios (Barzilai-Nahon, 2006).
- Atividades Ilícitas, trata-se da “divulgação de atividades que não sejam legais” (Barzilai-Nahon, 2006).
- Difamação, trata-se da “publicação de conteúdos que difamem a marca ou os utilizadores” (Barzilai-Nahon, 2006).
- Racismo, engloba “conteúdos que sejam racistas e que ofendam os utilizadores” (Barzilai-Nahon, 2006).
- Propensão para a Violência, tratam-se de “conteúdos que tenham como objetivo incitar à violência” (Barzilai-Nahon, 2006).
A partir da Teoria do Gatekeeping foram desenvolvidas várias teorias devido à larga diversidade do conceito e da sua aplicação a diversas áreas, tais como a comunicação, ciência da informação, ciência política, gestão da tecnologia, entre outras (Barzilai-Nahon, 2009).
1.1 Network Gatekeeping
Com o surgimento da Internet a comunicação sofreu uma transformação, Shoemaker e Vos afirmam em 2009 que “a Internet difere de outras formas de mídia e comunicação de massas, pois oferece maior oportunidade para interatividade e conversa bidirecional”, com esta maior proximidade das plataformas digitais os utilizadores podem entrar diretamente em contacto com o jornalista e darem o seu parecer sobre as notícias (Shoemaker e Vos, 2009). Os gatekeepers podem aumentar a sua eficácia usando a internet adequadamente, desta forma irão obter melhores informações e acesso a indivíduos comuns e/ou potenciais clientes (Moller e Halinen, 1999). A internet tem um potencial interativo muito grande e possui recursos característicos e isso aumenta “as formas pelas quais os indivíduos podem transformar o fluxo de notícias” (Finnemann, 2011). De acordo com Shoemaker e Vos os próprios membros do público são considerados como Gatekeepers secundários na Internet (Shoemaker e Vos, 2009). Vão mais além ao afirmar que a teoria do gatekeeping foi redefinida pelos membros da audiência devido ao seu papel mais ativo, aliado a isto afirmam ainda que o conceito de público também foi mudado pois estes “tornaram mais difícil medir e prever o público-alvo devido à influência global da Internet” (Shoemaker e Vos , 2009). “A Web 2.0 dá a todos uma oportunidade igual de se tornar um gatekeeper online e sugerindo que a própria multidão ou rede também funciona como um gatekeeper” (Keen, 2008)
Tendo tudo isto em consideração, foi em 2005 que Barzilai-Nahon desenvolveu uma nova teoria à qual chamou de Teoria do Network Gatekeeping. A autora explicou o desenvolvimento desta teoria numa declaração em que disse que “A Internet é um espaço aberto que dá origem a vários tipos de comportamentos e, como tal, o controlo de informação no meio online é frequente”, afirmou ainda que não só o papel dos gatekeepers mudou devido á Internet, mas também o próprio processo de gatekeeping; o processo de gatekeeping passa agora a englobar várias fases tais como: seleção, adição, retenção, canalização, manipulação, repetição, localização, integração, ignorar e exclusão de informações (Barzilai-Nahon, 2005).
Esta teoria possui diversas ramificações que vão desde a “compreensão da disseminação de informações” até ao estudo do “comportamento dos utilizadores na Internet”, porém o seu ramo principal baseia-se na “avaliação do poder das relações na Internet” e na “conceptualização da distribuição e os processos de controlo de informações” (Barzilai-Nahon, 2005). Os objetivos prenderam-se com a prevenção de utilizadores e empresas a “eventuais obstáculos que os impedem de ter uma presença eficiente e eficaz na Internet, bem como ajuda a perceber o tipo de forças que controlam e fornecem a informação que circula na rede” (Barzilai-Nahon, 2005).
1.2 Teoria do Gatekeeper
Kurt Lewin foi o primeiro autor com preocupações sociais na área da comunicação de massas a indicar que a passagem da informação pelos “portões” do gatekeeping era predefinida e a seleção da mesma era “regida ou por regras imparciais ou por um grupo no ‘poder’ que tem o papel de decidir: o que aprovar e o que rejeitar” (Traquina, 1993). No seguimento desta teoria, Lewin acreditava que “compreender como é que o portão funciona era compreender que fatores é que determinam as decisões dos gatekeepers” (D’Aiola, apud. Reis, 2016). Assim podemos afirmar que uma das explicações do jornalismo “advém da própria teoria do gatekeeper, pois a sua função está ligada intimamente à ação pessoal do jornalista”, isso faz com que o jornalista “perca a sua isenção de imparcialidade” ao efetuar o papel de Gatekeeper (D’Aiola, apud. Reis, 2016), assim o termo Gatekeeper pode ser aplicado “à pessoa que toma uma decisão numa sequência de decisões”, assim é normal que “uma notícia sobre um mesmo assunto difira de jornalista para jornalista” e que as notícias sejam “explicadas como um produto das pessoas e das suas intenções” (Traquina, 2002).
1.2.1 Teoria do Gatekeeper-White
Segundo White, “uma notícia é transmitida de um gatekeeper para outro na cadeia de comunicações” (Traquina, 1993). Acaba por ser através deste estudo do gatekeeper que White percebe que o processo de seleção da informação seguido da comunicação das notícias é feito de forma pessoal e arbitrária e, sendo o jornalista um gatekeeper, é responsabilidade deste selecionar o que deverá ser publicado e o seu detalhe (Traquina, 1993). Como observa Carla D`Aiola (2003) “o gatekeeper é quem determina o que atravessa o portão de entrada no jornal, ou seja, o que será visto pelo leitor” é ainda “aquele que determina o que será notícia e o que não será”. Sendo assim a teoria do gatekeeper acaba por limitar e minimizar outros pontos do processo de produção jornalística, ao propor “uma concepção bem limitada do trabalho jornalístico, baseando-se no conceito de ‘selecção’” (Traquina, 2002). Defendendo que o gatekeeping não é uma simples operação de selecção e querendo alargar este conceito, Donohue, Tichenor e Olien (presentes na obra de Traquina, 2002), apresentam outros elementos envolvidos no processo de aprovação ou rejeição de informação dizendo que o gatekeeping nos mass media inclui todas as formas de controlo da informação, que “podem estabelecer-se nas decisões acerca da codificação das mensagens, da selecção, da formação da mensagem, da difusão, da programação, da exclusão de toda a mensagem ou das suas componentes”.
Todas as conclusões que White apresentou foram analisadas e criticadas por diversos autores, que concluíram que o jornalista decide mediante de uma liberdade condicionada, sendo as razões da decisão do que passa pelo portão principalmente de foro profissional e não subjetivo, não decorrendo assim das avaliações pessoais do indivíduo que exerce a atividade jornalística mas da estrutura burocrática (Abras & Penido, 2006). Desta forma, a teoria do gatekeeper baseia-se numa selecção de informação, de tal forma “que a maior parte do gatekeeping cabe ao espaço organizacional, pois coloca limites ao trabalho do jornalista, que acaba por se submeter às políticas e aos interesses corporativos” (Abras & Penido, 2006). A análise das noticias que atravessam o portão é influenciada, maioritariamente, pelo meio em que vivem os jornalistas, sendo assim, a subjetividade destes acaba por ser determinada pelo seu ambiente social e comunitário e pela formação cultural e ideológica que lhe é intrínseca, incluindo a sua concepção ética, aquilo que considera como moralmente aceitável ou não (Abras & Penido, 2006)
1.2.2 Teoria do Gatekeeper – Breed
Devido à necessidade de se explicar a teoria do gatekeeper a partir do ponto de vista social, Warren Breed em 1955 cria a “teoria organizacional”, na qual o autor procurou, através dela, alargar a perspectiva teórica do gatekeeper, centrando-se no estudo da organização jornalística (Traquina, 2002). Ou seja, o jornalista seguirá mais facilmente as normas editoriais e organizacionais do local onde trabalha, do que as suas ideologias, as suas crenças pessoais (Traquina, 2002). Como a empresa controla o trabalho do jornalista, ele, enquanto funcionário da empresa, “aprende a antever aquilo que se espera dele, a fim de obter recompensas e evitar penalidades” (Traquina, 2002).
Na sua teoria organizacional, Breed identifica seis factores que promovem esta relação de conformismo do jornalista para com a política editorial da organização para a qual trabalha, sendo estes:
- A autoridade institucional e as sanções (Traquina, 2002).
- Os sentimentos de obrigação e de estima para com os superiores (Traquina, 2002).
- Aspirações de mobilidade (Traquina, 2002).
- A ausência de grupos de lealdade em conflito (Traquina, 2002).
- O prazer da atividade (Traquina, 2002).
- As notícias como valor (Traquina, 2002).
Portanto, segundo esta teoria, as notícias acabam por ser o resultado de sucessivos processos de interação social que têm lugar dentro da empresa jornalística (Traquina, 2002). Deste modo, “o jornalista sabe que o seu trabalho vai passar por uma cadeia organizacional em que os seus superiores hierárquicos e os seus assistentes têm certos poderes e meios de controlo”, isso faz com que ele tenha “de se antecipar às expectativas dos superiores para evitar retoques nos seus textos e reprimendas” (Traquina, 2002).
Breed conclui, então, que “a linha editorial da empresa jornalística é geralmente seguida”, e que “a descrição da dinâmica situação sociocultural da redacção sugerirá explicações para este conformismo.” (Traquina, 2002). Através desta teoria conseguimos perceber que os jornalistas não são os únicos gatekeepers, pois os editores também têm pelo menos uma importante palavra a dizer sobre a informação que deve ser publicada e que chega ao público (Traquina, 2002).
1.2.3 Teoria do Gatekeeper – Herman e Chomsky
Na sequência das teorias sobre a relação entre a seleção das notícias e a organização empresarial, surgiu a teoria da ação política (Traquina, 2002). Genericamente, pode dizer-se que esta teoria veio abordar a atividade jornalística sob o ponto de vista político e social e a sua capacidade enquanto Quarto Poder, apresentando os média como um instrumento que serve os interesses políticos ao considerar “que o conteúdo das notícias não é determinado a nível interior, nem a nível interno, mas a nível externo, a nível macroeconómico” (Traquina, 2002). Assim, o processo noticioso mantém uma relação direta com a estrutura económica da empresa jornalística, que dita o que é publicado (Traquina, 2002).
Herman e Chomsky (citados em Traquina, 2002) apresentam cinco factores que explicam a sujeição dos jornalistas aos interesses do sistema estabelecido:
- A estrutura de propriedade dos média (Traquina, 2002).
- A sua natureza capitalista, traduzida na procura do lucro e consequente importância da publicidade (Traquina, 2002).
- A dependência dos jornalistas das fontes governamentais e do mundo empresarial
- as ações punitivas dos poderosos (Traquina, 2002).
- A ideologia anti-comunista dominante entre a comunidade jornalística norte- americana (algo que hoje não se aplica) (Traquina, 2002).
- Newsmaking
Uma notícia é aquilo que a sociedade acha pertinente e relevante, (Fernandes, 2011).
A hipótese do newsmaking surgiu dos estudos de Kurt Lewin em 1947. Este senhor que nasceu onde nos dias de hoje é a Polónia, foi considerado o pai da psicologia pois no seu tempo de vida ele contribuiu imenso para os estudos sociais, (the author, 2008).
Kurt Lewin nesta hipótese aborda a produção de notícias, desde os processos pelos quais as informações passam até chegarem à sociedade, bem como os jornalistas selecionam essas informações. Estas são recolhidas através de acontecimentos do nosso dia a dia, passando por uma prévia seleção feita pelos jornalistas. Logo o tipo de notícia que chega ao público está dependente da interpretação e julgamento do emissor, (Silveira, Pavarino, 2009).
De modo a diminuir e selecionar a quantidade de informação existente, os meios de comunicação criaram um conjunto de critérios para ajudar nesta tarefa. Para ser produzida e selecionada a informação noticiosa, esta deve respeitar três exigências: “transformar um acontecimento desconhecido num acontecimento notável e reconhecido por todos”, “ relatar os acontecimentos de forma a demonstrar que foram tratados de forma natural, sem qualquer tipo de pressões ou influências” e “organizar a informação no tempo e no espaço, de forma a ser trabalhada e planificada, permitindo então que os acontecimentos noticiáveis fluam” (Wolf, 1995, pp. 188-189). Na hora de produzir as informações, “a elaboração da pauta, a seleção das fontes e o trabalho de apuração, redação e circulação da notícia” são fatores decisivos na escolha da informação, tal como os valores da pessoa que está a selecioná-la, (Traquina, 1988/1993:167).
Deste modo, é correto afirmar que o newsmaking vem provar o prestígio do trabalho dos profissionais e dos processos pelos quais eles passam. Estes precisam de selecionar as ocorrências que são dignas ou não de ser divulgadas, tendo por base “um número imprevisível e indefinido de factos” selecionam apenas uma “quantidade finita e estável de notícias”” (Wolf, 1995, p. 190). Com este trabalho em mãos, houve a necessidade de criar algo que ajude a dividir o que é, ou não, útil para ser noticiado. Criaram-se três objetivos principais para estes critérios: fazer com que algo pouco conhecido se tornasse importante socialmente, contar o que aconteceu fazendo parecer que é natural e nunca forçado, e, por último, manter a informação junta e metodicamente posta de modo a ser fácil agrupá-la em espaço-tempo, deixando as notícias fluir (Wolf, 1995, pp. 188-189).
Wolf (2003) diz então que o jornalismo tem obrigatoriamente uma passagem pela noticiabilidade e os critérios de relevância, que definem o valor de um acontecimento na sociedade.
2.1. Noticiabilidade e valores notícia
Noticiabilidade pode ser definida como “o conjunto de elementos através dos quais o órgão Informativo controla e gere a quantidade e o tipo de acontecimentos, de entre os quais há que selecionar as notícias” (Wolf, 1995, p. 195). Posto isto, sabemos que os valores notícia são componentes desta e que têm como objetivo dar resposta a “quais os acontecimentos que são considerados suficientemente interessantes, significativos e relevantes para serem transformados em notícias?” (Wolf, 1995, p. 195).
Sendo assim os valores de notícia seriam “critérios de relevância espalhados ao longo de todo o processo de produção” (Wolf, 1995, p. 195) que são relevantes até à conclusão da criação da notícia, podem ser utilizados com duas funções diferentes: como componentes incorporados no trabalho final, ou como um guia para moldar o que será mostrado à sociedade. Estes valores transformam-se em particularidades dos eventos ou do trabalho jornalístico, a partir dos quais dá para entender os dados que podem ser colocados na informação noticiosa. Assim, os valores notícia tornam mais fácil, rápido e eficaz o trabalho dos profissionais.
Para que estes funcionem adequadamente, é necessário que a maneira de os aplicar seja versátil, rápida e fácil, para que não restem dúvidas quanto à divisão dos conteúdos. Com isto por base é possível afirmar que os valores notícia têm “por objectivo atingir fins práticos de uma forma programada” e estão destinados “a tornar possível a repetitividade de certos procedimentos” (Wolf, 1995, p. 197), e por isso devendo dar oportunidade para uma separação quase automatizada. Ainda que possam ser definidos e explicados, é um facto que os valores notícia mudam conforme os tempos correm, tendo em conta que coisas que eram relevantes no passado, hoje não o são.
2.2 Critérios de seleção de informação
Um dos critérios mostrados por Wolf, que o mesmo considera como classe dos valores notícia, são os critérios relativos ao produto. Este “diz respeito à disponibilidade de materiais e às características específicas do produto informativo” (Wolf, 1995, p. 206), que está ligado ao fácil alcance do acontecimento e à capacidade de administração jornalística, principalmente se não levar a um grande consumo de meios. “Os critérios relativos ao produto são aplicados a cada notícia mas, “quanto menos importante é a notícia, mais eles entram em jogo na sua avaliação”” (Gans, citado em Wolf, 1995, p. 206).
Outro critério, corresponde ao da brevidade, que implica a notícia não ser muito extensa para que as pessoas que a leem conseguirem guardar a o material que lhes foi transmitido. É trabalho do jornalista fazer com que fiquem escritos apenas as partes mais importantes dos documentos noticiosos. Nos critérios de relevância que dizem respeito ao produto está inserido aquele que fala sobre a notícia como resposta de uma filosofia da informação, que se enquadra na história classificação informativa e do jornalismo. Desta forma, “constitui notícia aquilo que altera a rotina, as aparências normais” (Wolf, 1995, p. 206). Como afirmam Galtung e Ruge, quanto mais marcante e escandaloso for um evento, maior será a probabilidade de ser transformada em notícia.
O terceiro critério corresponde à atualidade e à frequência, mais especificamente à periodicidade, de modo que esta demonstra como é que determinado acontecimento demora a ser transformado até obter algum sentido. O valor notícia, correspondente ao critério relacionado à frequência, trata da demarcação do espaço-tempo que é intrínseco à notícia. De acordo com a visão da escolha de ocorrências capazes de serem publicadas, Wolf considera que este critério “facilita e confere maior rapidez à escolha” (Wolf, 1995, p. 211) uma vez que, demanda uma pré-seleção antes da execução dos outros valores notícia.
O valor notícia que remete ao meio de comunicação, indica o tempo de extensão das produções, acabando assim por ser distribuído. Uma mudança significativa feita na base de uma produção noticiosa, segundo Wolf, terá sempre a modificação dos valores notícia usados na seleção das informações.
A continuidade também considerada valor de notícia, retrata atuais progressos de uma acontecimento já explorado. Se uma informação noticiosa é considerada reiterativa, não terá capacidade de ser publicada.
O equilíbrio, último valor notícia relativo ao produto e ligado à “composição equilibrada do noticiário no seu conjunto” (Wolf, 1995, p. 209). As notícias buscam a numerosidade, de maneira a manterem-se equilibradas. Esse balanço só é possível quando estas se apoderam de todo o país e referem todas as faixas etárias e classes sociais.
Wolf menciona ainda, um outro critério que foca no meio de comunicação, mais especificamente na televisão, não por este ser superior ao resto dos meios, mas sim por este concentrar-se nas imagens associadas às notícias apresentadas. Pois na hora de apresentar uma notícia são nas palavras onde reside a informação necessária para criar uma boa notícia, visto que estas podem apresentar imagens ou não, uma vez que estas funcionam como um complemento da notícia.
Isto é o que acontece na televisão, primeiro relata-se a informação e só depois é que são apresentadas as imagens a complementar a notícia. Gans (citado em Wolf, 1995, p. 210), afirma que a televisão “procura produzir um produto interessante e que entretenha o seu target, o seu público-alvo”, já que se uma notíca for passada no meio de comunicação televisão e não apresente texto verbal nenhum, para além de ficar descontextualizada torna-se aborrecida e confusa para os espectadores. É por esta razão que o valor notícia está ligado aos critérios de relevância relativos ao público.
O quarto valor notícia são precisamente estes critérios relativos ao público, que consistem no foco dos jornalistas na notícia e nas informações que estão a transmitir e não no público, pois quanto mais tempo passarem nestes menor se dedicam à notícia. (Wolf ,1995, pp. 212-213).
Para finalizar, a competição existente entre os meios de comunicação contribui para que haja modelos de referência entre eles. Esta competição está relacionada com os critérios relativos à concorrência, que vem também reforçar alguns valores notícia. Os valores notícia passam também por uma avaliação relativa à reciprocidade que possuem entre as ligações formadas entre eles, e esta avaliação pode ser igualmente realizada através dos critérios relativos aos produtos, ao meio de comunicação e ao formato, (Wolf, 1995, p. 199).
Assim sendo, para Wolf, haveria quatro variáveis do fator que leva à importância:
- O estatuto social do indivíduo, quanto mais alta é a classe social de sobre quem é a notícia, mais facilmente a sociedade o reconhece;
- A repercussão que tem na sociedade, se o acontecimento for sobre o país em questão ou sobre algo que o impacte diretamente, a notícia tem mais valor;
- A quantia de indivíduos inseridos na ocorrência, se houver mais vítimas num acidente ou mais figuras da alta sociedade juntas em algum sítio, a notícia é mais viável;
- O seguimento, se a notícia for o acontecimento adjacente ou da mesma sequência de outra, tem mais prestígio, assim como se for possível haver uma continuação no futuro.
- Diferença entre Gatekeeping e Newsmaking
Os estudos realizados sobre a teoria do Gatekeeper tendiam a relacionar o que saía nos media através de um processo que organizava o que era viável de ser transmitido, realizado pelo chamado “Guarda do Portão” (o gatekeeper), já as pesquisas a serem feitas no âmbito do newsmaking “relacionam a imagem da realidade social, fornecida pelos mass media, com a organização e a produção rotineira dos aparelhos jornalísticos” (Wolf, 1995, p. 183). Assim, a mais evidente distinção entre o Gatekeeping, onde são escolhidos os conteúdos, e o Newsmaking, onde são produzidos, é o facto de, na sua produção, esta não se prender exclusivamente “à cobertura de um acontecimento particular, mas ao andamento normal da cobertura informativa por períodos prolongados” (Wolf, 1995, p. 186).
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