Crítica: Nota Sobre a Supressão Geral dos Partidos Políticos, Simone Weil, 1943

Face a atitudes maniqueístas que opõem categoricamente o bem ao mal, ou a verdade à mentira, munidos do mesmo grau de desconfiança que Simone Weil reserva a expressões de pensamentos precedidas, de forma implícita ou explícita, pela palavra «nós», vimos hoje recomendar a leitura de um dos textos mais conhecidos da filósofa mística francesa: «Nota sobre a Supressão Geral dos Partidos Políticos». Simone Weil dá o tiro de partida para este breve mas irresistível argumentário contra a peste das paixões colectivas cometendo a audácia de corrigir o pensamento de Rousseau a respeito da vontade popular. É que, segundo a análise de Rousseau, as vontades particulares, pela sua própria natureza e dimensão individuais, tendem a neutralizar-se e a compensar-se mutuamente, desaguando numa vontade popular que melhor se adequa à justiça do que aquelas. No entanto, no instante em que a paixão colectiva passa a participar nesta equação, da qual se ausentara durante o raciocínio de Rousseau, a equação desaba. A justificação de Simone Weil é a mais transparente: «As paixões divergentes não se neutralizam, ao contrário do que acontece com uma poeira de paixões individuais fundidas numa massa; o número é demasiado pequeno, a força de cada uma delas é demasiado grande, para que possa haver neutralização.» A simples existência de partidos políticos, angariações de paixões colectivas por excelência, cobre de espinheiros o caminho do indivíduo. O militante é comparado a um homem incumbido de fazer cálculos mentais complexos sabendo que será chicoteado de cada vez que obtiver um número par. «Alguma coisa na parte carnal da alma incitá-lo-á a arranjar maneira de obter sempre um número ímpar.» Quanto ao insubmisso, «arriscar-se-á a encontrar um número par mesmo onde ele não é suposto existir. Face a esta oscilação, a sua atenção deixa de estar intacta. Se os cálculos forem complexos ao ponto de exigirem da sua parte a plenitude da atenção, é inevitável que se engane frequentemente. De nada servirá que seja muito inteligente, muito corajoso, muito empenhado na verdade.» Um sistema no qual um indivíduo, tendo optado por determinada opinião, se recusa a examinar uma contrária, configura assim a transposição do espírito totalitário. A agressão perpetrada por pessoas honestas contra pessoas inocentes em nome de um espírito partidário parece ser, para a autora, condição suficiente para a repressão desses organismos. Tal supressão – e cabe aqui sublinhar que o texto, embora sugestivo, corre omisso quanto à sua concretização – não poderia, no entender de André Breton, resultar de um golpe de força sem uma absoluta desnaturação, mas conceber-se após um longo trabalho de desengano colectivo. Não obstante esta lúcida ressalva, não deixa de ser curiosa a recepção entusiástica de Breton, fruto porventura de um longo trabalho de desengano pessoal.

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