A Dualidade Litoral-Interior – Desafios e Oportunidades da Efetiva Coesão Territorial

Resumo

Num mundo em constante mudança, é preciso perceber se esta acontece ao mesmo tempo para toda a gente e todos os territórios. Com este artigo procurarei fornecer algumas informações sobre a dualidade litoral-interior no contexto do continente português, e como se trata de um processo social e político de relevância e como podemos colaborar com a governança para promover uma maior e mais eficaz coesão territorial. A metodologia passará por uma contextualização teórica, multiautoral, uma análise SWOT dos territórios e sua análise assim como sugestões de desenvolvimento de modelos de governança colaborativa, valorização de recursos e regionalização.

Palavras-Chave

Litoral, Interior, Coesão territorial, Políticas

Introdução:

A densidade populacional bruta do continente centra-se na sua maioria em Lisboa e no Porto, salvo algumas exceções. Os Censos de 2021 referiram que metade da população vive em 31 concelhos, que representam um décimo dos concelhos em Portugal, sendo os dez mais populosos Lisboa, Sintra, Vila Nova de Gaia, Porto, Cascais, Loures, Almada, Matosinhos, Oeiras e Braga. Com isto, observamos que o peso da população residente em Lisboa e no Porto é superior aos alojamentos disponíveis, assim como mais de metade do poder de compra se concentra nas grandes áreas metropolitanas, dados constantemente presentes nas notícias atuais, porém já se trata de um problema antigo.

As diferenças demográficas, culturais e socioeconómicas levaram o país a delimitar os territórios continentais e regionais menos povoados, mais envelhecidos e menos dinâmicos economicamente. São chamados territórios do interior, mas abrangem uma multiplicidade de regiões, ao todo são 165 concelhos e 73 freguesias de norte a sul (Craveiro, s.d.), desertificados, desordenados, onde faltam pessoas, mas também diversidade na atividade económica e emprego, a população envelhecida com défice de meios e infraestruturas. O mapa provido pelo Programa de Valorização do Interior, segundo entrada no Diário da República (2020), pesa 50% na densidade populacional, o restante o conjunto de dados de uso do solo, variação populacional, pirâmide demográfica, relação entre jovens e idosos, perfil de povoamento, rural e urbano, rendimento médio mensal, peso da população com terceiro ciclo do ensino básico, condições de acesso a bens, serviços e a capital regional. Estes dados são onde se fundamentam para determinar as políticas públicas.

Porém, garantir que, quando falamos de interior, falamos de interiores distintos, o interior alentejano não é igual ao interior beirão, que o algarvio não é igual ao transmontano, e mesmo com a proximidade, Beira Baixa não é igual à Beira Alta, porque o interior é uma multiplicidade de fatores, que vão desde as dinâmicas sociais, aos riscos, à vulnerabilidade e à capacidade de resiliência e resistência das populações e dos ecossistemas, inúmeros fatores, que se tenta enquadrar num todo.

Territorialidade e Coesão

A questão da territorialidade está cada vez mais presente na agenda política, seja na europeia, mas também nacional, o destaque vai para a coesão territorial, considerada como um dos três pilares da Política Regional perante a União Europeia, juntamente com a coesão económica e social (Delgado et al, 2022).

Esta presença nos temas políticos advém do objetivo de “ressalvar a governança territorial enquanto motor da cooperação institucional” (Marques et al., 2018 cit por Delgado et al, 2022), assim como atenuar as diferenças adjacentes aos diversos territórios, seja geograficamente como socialmente, de forma a contrariar a discriminação e a segregação territorial, partindo de uma definição da coesão territorial como uma ação pública que contribua para a redução de disparidades em regiões e a mitigação desses efeitos na qualidade e no acesso aos serviços (Delgado et al, 2022).

As diferenças entre o litoral e o interior de Portugal, dá destaque ao litoral com território mais dinâmico e concentrado a nível populacional, enquanto o interior sofre com a segregação geográfica, subdesenvolvimento, isolamento e desertificação, “trata-se de um território debilitado economicamente, com fraca densidade demográfica, população envelhecida, que se vai esvaziando e desertificando”. Promover a coesão e o desenvolvimento das geografias do interior e da interioridade em Portugal, através de ações concertadas e eficazes envolvendo atores público-privados, promovendo um novo olhar sobre o interior que promova a reconstrução e a libertação da segregação (Nascimento, 2018).

Sociedade do Risco e o Papel da Ciência nas Políticas

Numa nova versão da modernidade, Beck (1996) inaugurou a temática da sociedade do risco, numa sociedade onde os riscos são produzidos pela própria atividade humana, seja ela a tecnologia, a indústria e a ciência e não apenas por eventos naturais. Caracterizou os riscos como globais, que afetam toda a sociedade, independentemente da sua posição social ou geográfica. Ou seja, a definição advém da falta de controlo perante os riscos, assim como a incerteza e a necessidade da tomada de decisões adequadas. Implicando sempre as particularidades dos territórios e das populações.

A dificuldade de encontrar soluções institucionais para lidar com uma nova sociedade de risco, derivada as questões da globalização, que esteja num ambiente abrangente de seguro. Segundo Beck (1996), as respostas institucionais para estes desafios ainda não foram pensadas, inventadas ou testadas com sucesso, apesar que, desde a redação desse texto, até aos dias de hoje, já tenha havido progressos neste tema. Porém o autor refere a importância de reexaminar todas as abrangências da sociedade, neste caso, as questões territoriais e como as políticas deverão ser executadas para procurar uma inclusão.

Já em 1997, Beck, ao abordar o papel das subpolíticas, aborda a relação entre o indivíduo e o sistema, numa crise institucional assim como a influência de fatores, como proteção social, regulamentação do trabalho, e educação, entre outros. Discute-se então a mudança na perceção da sociedade em relação à proteção ambiental e à responsabilidade do setor privado e público em relação a essas mudanças de paradigma.

A redefinição dos quadros da política, só pode ser realizada em sistemas locais complexos e em grande medida autónomos. A isso se chama de regionalização, que pressupõe uma mudança de estruturas institucionais assim como uma redistribuição do poder político (Beck, 1997).

Ou seja, abordar a regionalização é abordar uma nova forma de ver a política e de disseminar a informação a toda a população e a todo o território, devido a questão do risco e como este é visto perante os territórios. As políticas devem ser adequadas e adaptadas a todas as questões e não a uma generalização das populações mais centradas no litoral. Encontramos um aliado na ciência, num panorama multidisciplinar, na geografia humana e física, assim como nos papéis das ciências sociais, e ciências exatas, que fundamentam os papéis territoriais e da “segregação política” adjacente da divisão do território. As estratégias de difusão e disseminação do conhecimento científico, existem diferentes abordagens que correlacionam a política e a ciência; Callon (1999) abordou esse tópico na relação política-ciência, sendo que o primeiro modelo é baseado na confiança que as pessoas comuns têm nos cientistas enquanto o segundo modelo enfatiza a representatividade na tomada de decisões políticas. Já o terceiro é baseado na coprodução de conhecimento entre especialistas e grupos de pessoas afetadas por essas questões, enfatizando a importância da participação destes grupos na tomada de decisões políticas. Neste ponto conseguimos conciliar com a versão de Beck (1997) nas subpolíticas também, onde pretende que os cidadãos façam uma participação cívica ampla através da cidadania; “A subpolítica não é simplesmente uma forma diferente de política, mas a expressão de uma mudança fundamental na natureza da política, que implica na desintegração das estruturas de poder existentes e na emergência de novas formas de ação coletiva e mobilização social” (Beck, 1997).

Ou seja, conseguimos entender, através destes autores que a política é uma ação que deve ser participada, exatamente por quem tem lugar de fala, e a representação do interior na governança portuguesa, e talvez em panoramas externos, falha neste ponto, um grande exemplo é que Lisboa consegue eleger mais deputados para a assembleia da república do que o interior todo (48 deputados por Lisboa, 5 Vila Real, 3 Bragança, 8 Viseu, 3 Guarda, 4 Castelo Branco, 2 Portalegre, 3 Évora, 3 Beja, 9 Santarém, que perfazem 40) (Visão, 2019). Falar de Regionalização, Políticas Eleitorais e representação política, são três assuntos obrigatórios ao abordar este dilema.

Desafios e Oportunidades da Coesão Territorial – Uma análise SWOT da Dualidade

Alcançar a coesão territorial em Portugal requer uma ação coordenada, eficaz e eficiente dos atores públicos e privados a níveis local, regional e nacional. Paisagens, recursos endógenos, patrimônio natural e cultural e populações precisam ser integrados para melhorar a diversidade geográfica, aumentar a sustentabilidade e fortalecer áreas montanhosas, fronteiriças e segregadas. Além disso, é importante equilibrar a preservação e proteção de valores com novos usos sustentáveis ​​de forma a mobilizar e incluir o património natural e cultural no processo de desenvolvimento territorial, de forma a beneficiar as comunidades locais de forma a atrair turistas e novos residentes, e mesmo os novos nómadas digitais (Nascimento, 2018).

Avaliar as forças, fraquezas, oportunidades e ameaças de ambos os territórios torna-se um passo fundamental para a compreensão destes, assim como uma ferramenta fundamental para a aplicabilidade das políticas de efetiva coesão territorial, e o claro papel da ciência no assunto.

A análise SWOT é uma das técnicas mais utilizadas em investigação social, estando na elaboração de análise organizacional ou na elaboração de planos. Neste caso, pretendo elaborar uma análise SWOT específica da população do interior e do litoral português, baseando-me em dados estatísticos, permitindo compreender e estudar o comportamento desta população face a vulnerabilidade do território (Salafranca, 2022).

Conseguimos avaliar impactos internos e externos, no que concerne a pontos fracos e fortes (forças e fraquezas), e ameaças e oportunidades, respetivamente, conseguindo conceber onde se poderá avaliar a resiliência da comunidade perante adversidades e os seus riscos e vulnerabilidades (Salafranca, 2022), assim como, estes poderão influenciar as políticas do território, como um todo.

ANÁLISE SWOT DO INTERIOR (BASEADO EM DADOS DAS CIMs VISEU DÃO-LAFÕES E BEIRAS SERRA DA ESTRELA

Análise Interna

Forças

Fraquezas

  • Diversidade de recursos naturais
  • Acesso e conhecimentos a recursos agrícolas e florestais
  • Boa base para a fixação de empresas e indústrias
  • Localização geográfica estratégica no contexto ibérico**
  • Capacidade empreendedora da população (do ponto de vista da presença de órgãos de apoio ás empresas e ao investimento dos politécnicos na região, para a captação de jovens e promoção da ciência e tecnologia*
  • Existência de Parques industriais e tecnológicos com especializações setoriais **
  • Existência de serviços de apoio aos investidores **
  • Capacidade de atração de empresas em sectores emergentes **
  • Boa cobertura e diversidade de equipamentos sociais **
  • Consolidação dos núcleos urbanos principais sedes de concelho ****
  • Boa cobertura territorial pela rede viária ****
  • Proximidade da fronteira
  • Presença de áreas protegidas e no âmbito da rede natura 2020
  • Sediação local de infraestruturas técnicas e de ensino superior (IPV, IPG, UBI)
  • Falta de estratégia para a valorização dos recursos naturais
  • Estrutura de apoio social e económico deficiente ou que não chega a todos
  • Litoralização das massas em idade ativa
  • Rede de transportes deficitária ***
  • Limitações à ocupação e utilização do território e degradação do solo ***
  • Cobertura insuficiente ao nível da drenagem e tratamento de águas residuais ***
  • Abandono dos espaços rurais ***
  • Território disperso e de baixa densidade ****
  • Esvaziamento de núcleos de pequena dimensão ****
  • População envelhecida, aumento do grau de dependência****
  • Presença de população com baixo ou nenhum nível de escolaridade (Censos, 2021)
  • Défice no âmbito da literacia digital
  • Área tendencialmente prejudicada pela seca e pelos incêndios florestais
  • Baixa taxa de natalidade face à média do país ou áreas litoralizadas

Análise Externa

Oportunidades

Ameaças

  • Procura ativa da ruralidade como turismo
  • Aparecimento de novas tecnologias
  • Possibilidade de implementação do desenvolvimento sustentável
  • Parcerias e estudos com o ensino superior local
  • Potencial económico e ambiental das energias renováveis***
  • Possibilidade de aproveitamento da biomassa***
  • Fortalecimento de parcerias público/privadas***
  • Sinergias intermunicipais, nomeadamente entre municípios com relações mais intensas ****
  • Centralização de serviços
  • Falta de atratividade laboral e especialista nas camadas jovens
  • Desertificação
  • Concorrência direta de territórios mais competitivos e atrativos e de sistemas urbanos em desenvolvimento ***
  • Custos de contexto associados à interioridade
  • Alterações climáticas ***
  • Continuação do processo de desertificação humana (decréscimo e envelhecimento populacional) e do solo ***
  • Fraca cultura de cooperação institucional***
  • Isolamento da população sem transporte individual ****
  • Planeamento do território ainda pouco objetivo nos critérios de localização das atividades ****
  • Estradas sinuosas e com fortes declives ****

* 21% da população da CIM se encontrava empregada por conta própria. Ainda assim, acima da média da Região Centro (20%) (Beiras e Serra da Estrela, s.d.)

** (Beiras e Serra da Estrela, s.d)

*** (CIM BSE, 2015)

**** (CIM Viseu Dão Lafões, 2016) ANÁLISE SWOT: UM ESTUDO DE CASO EM UMA EMPRESA DELIVERY LOCALIZADA EM  JUAZEIRO-BA Resumo: O presente estudo tem como objetivo e

(Salafranca, 2022)

ANÁLISE SWOT DO LITORAL (BASEADO NOS PDM E REOT DAS ÁREAS METROPOLITANAS DO PORTO E LISBOA)

Análise Interna

Forças

Fraquezas

  • Boa base para a fixação de empresas e indústrias
  • Presença de órgãos de apoio às empresas e ao investimento dos politécnicos e universidades na região, na captação de jovens e promoção da ciência e tecnologia*
  • Existência de Parques industriais e tecnológicos com especializações setoriais **
  • Existência de serviços de apoio aos investidores
  • Boa cobertura e diversidade de equipamentos sociais mais especializados
  • Consolidação dos núcleos urbanos principais
  • Boa cobertura territorial pela rede viária
  • Sediação de infraestruturas técnicas e de ensino superior
  • Grande captação de jovens e famílias de outros territórios
  • Elevados fluxos migratórios e de turistas
  • Boa rede de serviços públicos centrais, universidades
  • Elevado número de eventos culturais
  • Forte empregabilidade na área dos serviços *
  • Valorização da proximidade ao mar
  • Boa oferta em equipamentos de saúde, proximidade com serviços especializados, por ex. IPO **
  • Grandes estruturas comerciais
  • Desenvolvimento centrado na economia
  • Centro de decisão económica, política nacional
  • Falta de estratégia para a valorização dos recursos naturais
  • Fraco peso do setor agrícola
  • Degradação do edificado
  • Oferta limitada de habitação a preços acessíveis
  • Dinâmica insuficiente do mercado de arrendamento **
  • Insuficiente rede pública de equipamentos sociais de proximidade (Creches, ATL, ERPI e Centros Dia) **
  • Vulnerabilidade à pobreza da população desempregada e dos reformados, assim como trabalhadores com ordenados baixos
  • Elevado número de sem-abrigos (cerca de 4100 só em Lisboa) ***
  • Elevado número de dependentes de assistência social
  • Carência de espaços verdes
  • Risco sísmico
  • Consumo excessivo de recursos naturais
  • Poluição sonora e luminosa
  • Sobrepopulação
  • Elevado tempo em rede viária, que poderá levar a perda de tempo de lazer
  • Riscos Tecnológicos adjacentes à grande industrialidade

Análise Externa

Oportunidades

Ameaças

  • Procura ativa como zona de turismo
  • Aparecimento de novas tecnologias
  • Fortalecimento de parcerias público/privadas
  • Centralização de serviços
  • Atratividade laboral e especialista nas camadas jovens
  • Territórios mais competitivos e atrativos
  • Sistemas urbanos em desenvolvimento
  • Cultura de cooperação institucional
  • Grande rede viária e transportes públicos (metro, comboio, barco, aeroportos)
  • Diversidade étnica com forte potencial económico **
  • Atração de estudantes universitários, nacionais e estrangeiros **
  • Função do Litoral como porta de entrada para a Europa **
  • Melhoria das questões de acessibilidade
  • Qualificação elevada da população ativa **
  • Qualificação ambiental das áreas costeiras e ribeirinhas
  • Dotação de equipamentos sociais e mecanismos de proteção social abrangentes de forma a combater a pobreza **
  • Planeamento do território com enorme urbanização trazendo perdas e défices de zonas verdes
  • Saída da população para áreas suburbanas com oferta de melhores preços da habitação **
  • Congestionamento urbano e poluição ambiental em algumas áreas **
  • Excessiva concentração de população em bairros sociais **
  • Aumento da criminalidade
  • Risco de redução de investimento
  • Baixa taxa de natalidade

* (REOT Lisboa, 2009) ** (PDM Lisboa, s.d.)

*** “Portugal terá cerca de 8200 pessoas em situação de sem-abrigo, segundo resultados de um levantamento nacional que revelam que mais de metade dessa população se concentra na área metropolitana de Lisboa” (Diário de Notícias, 2019)

PDM – Plano Diretor Municipal

REOT – Relatório de Estado de Ordenamento do Território

Análise:

Conseguimos conceber, após avaliação das análises SWOT, que as particularidades destas duas regiões se cingem muito à sua interioridade e à centralização de bens e serviços.

Ao fazer duas análises em separado permitem-nos conceber uma realidade mais macro de ambos os territórios, e uma forma clara de conceber as reais diferenças desta dualidade.

Em análise da primeira tabela, observamos que a própria população, sendo por si só, mais envelhecida, isolada e distanciada da informação ou mesmo do seu acesso, com grandes valores no índice de envelhecimento demográfico, algum nível de analfabetismo, agregados com mais de 65 anos, implica um risco. Aliás, a CIM Viseu Dão Lafões já aborda este tema como ameaça e como alvo de severo investimento económico (Salafranca, 2022). Talvez, não da forma que pretendemos aprofundar neste trabalho, mas sim de um ponto de vista de mobilidade e combate à segregação territorial.

Quando procuramos enquadrar com a realidade litoral, apercebemo-nos do grande contraste, e a base desta dualidade, podemos reunir então um conjunto de conclusões sobre o artigo e sobre as análises concretizadas:

Diferenças Demográficas:

As diferenças demográficas entre o litoral e o interior de Portugal são notáveis, sendo a densidade populacional no litoral é maior devido à presença de grandes centros urbanos e atividades económicas. Por outro lado, o interior enfrenta desafios como o envelhecimento da população e o êxodo rural, resultando em uma menor densidade populacional.

Infraestruturas e Acesso a Serviços:

O litoral apresenta condições mais desenvolvidas, incluindo serviços públicos como saúde, educação e transporte. Em contrapartida, o interior tende a ter uma infraestrutura limitada e menor oferta de serviços básicos e especializados, dificultando seu desenvolvimento económico e qualidade de vida das populações.

Setor Económico:

O litoral possui uma maior diversidade, que engloba turismo, indústria, comércio e serviços, assim como a sua proximidade com o mar e centros urbanos. Já o interior depende mais da agricultura, pecuária e dos recursos naturais, com obstáculos na diversificação económica e criação de empregos. No respeito aos recursos naturais e ambiente, observa-se que o litoral conta com recursos costeiros e marítimos abundantes para turismo, pesca e energia, porém sobre com um excesso de urbanização e um consumo excessivo de recursos, enquanto o interior dispõe de terras agrícolas, florestas e potencial energético renovável.

Pressão Ambiental e Riscos:

O litoral enfrenta problemas como turismo excessivo, urbanização desordenada e eventos climáticos extremos (tempestades, inundações e erosão costeira, agregando o risco sísmico); o interior, por sua vez, lida com incêndios florestais, secas, ondas de calor e de frio assim como perda de biodiversidade, que obriga a ações de conservação e adequado ordenamento de território. Incluindo também diferenças claras na topografia, no clima e consequentemente sujeição aos riscos diversos.

Políticas Públicas – em busca da equidade na coesão territorial

Avaliar o património cultural, material e imaterial, público e privado, é uma atividade de grande relevância, assim como a pesquisa de recursos naturais e culturais, realizar cartografia, desenvolver e disseminar o conhecimento e aprimorar habilidades e qualificações. É fundamental uma articulação com a população, preservando os valores culturais e naturais. É crucial atrair atores individuais e coletivos nos objetivos partilhados e nas decisões estratégicas conjuntas, responsabilizando-os conjuntamente pela missão de criar condições favoráveis ao desenvolvimento das áreas onde habitam e exercem suas atividades profissionais (Nascimento, 2018), assim é uma forma de contrariar a segregação e promover a efetiva coesão territorial.

Há muito que é debatido e proposto um conjunto de medidas e de políticas que visem a coesão territorial, a segregação imposta pela governança, pelas populações e pelos atores público-privados, impõe uma desigualdade de acesso em diferentes versões.

Tende-se a observar o interior como território sem valor político, porque os representantes políticos são insuficientes, porque se trata de um território empobrecido, porque a máquina capitalista se encontra no litoral, um território que tende a estar fadado à desertificação, por não haver oportunidades para os jovens e não haver captação de rendimento, falta de recursos e centralização de serviços públicos, ou insuficiência destes, uma população mais envelhecida que não vê o seu acesso adaptado aquilo que são as políticas de modernização (ex. SIMPLEX). É importante que o poder político olhe além dos resultados eleitorais, olhe além dos eleitos, olhe além dos preconceitos, priorizando a coesão, a justiça e a equidade. É imperativo que os resultados das inovações científicas, e que as políticas sejam adaptadas aos territórios, através de uma negociação adaptada e não um modelo semelhante para todas as regiões, aplicar uma política interventiva e não meramente formal.

A dualidade litoral-interior é perpetuada pela perceção dos territórios, porém os fatores políticos, sociais e mesmo de carácter administrativo acabam por dificultar a questão demográfica, este desafio é combatido através de políticas públicas específicas, e a coesão prende-se com mitigação de desigualdades sociais e de acesso a serviços. O papel das populações e dos representantes públicos e privados, assim como a esfera civil e o terceiro setor, paralelamente com a comunidade científica procurem mitigar as desigualdades existentes nas políticas públicas, que juntos proponham projetos que salvaguardem a realidade de todo o país e não apenas parte, adequando e criando propostas no âmbito do território e todas as suas particularidades.

Anexando estas soluções de participação cidadã ativa e de todos os atores abrangidos, na literatura é possível encontrar um conjunto de caminhos e estratégias para alcançar o melhor e mais eficiente desenvolvimento territorial: Incluir o desenvolvimento sustentável e inclusivo como meio, nos territórios de baixa densidade, com desafios e riscos inerentes ao despovoamento e à falta de dinamismo económico. O papel das capitais territoriais na atração de novas atividades socioeconómicas, culturais e científicas. A valorização de ativos endógenos, como o património natural e cultural, que têm de ser vistos como singulares e autênticos e não passíveis de destruição. A promoção do empreendedorismo social assim como o (auto)empoderamento, de forma a promover a participação cívica ativa dos diferentes atores sociais, com ações conjuntas de cooperação. Promover e alocar o ensino superior nestas regiões como um ativo fundamental e válido para dinâmicas de restruturação sustentável e inovadora, assim como uma agenda inovadora da investigação nos territórios do interior português de forma a reforçar oportunidades (Vaz & Nofre, 2017).

Conclusões

É importante que as políticas públicas, com o apoio dos poderes locais, façam um processo preventivo e promotor mais centrado “na pessoa”, ou seja, no tipo de população residente, não podemos colocar os portugueses todos no mesmo copo, pois aquilo que nos distingue é de onde vimos, e cada pessoa reage e previne-se nas bases do seu círculo social, cultural, político e económico.

O interior, por si só, tende a ser o parente pobre da governança, segundo a oposição política e testemunhos dos seus residentes, e é importante o papel dos poderes locais na descentralização das políticas públicas e do conhecimento, de forma a propaga-lo da maneira mais adequada à sua população, e fazer esta análise mais científica do interior, aproveitando a multidisciplinaridade no que concerne à investigação do risco, juntar as ciências exatas com as ciências sociais, para que se possam tratar objetivos da forma mais adequada possível.

Um território do nosso país altamente contrastante com os fenómenos demográficos, onde se rege pelas tendências demográficas negativas, um abandono populacional e uma taxa de envelhecimento demográfico de em média 291 idosos para 100 jovens (Censos, 2021), quase o triplo, a perda de dinamismo económico demonstra uma clara fragilidade administrativa perante o litoral, assim como, perante as políticas propostas e perante a ação implementada.

Neste artigo pode-se avaliar de forma clara essas diferenças, e o papel destas na políticas públicas de efetiva coesão territorial, o que se observa hoje em dia são políticas generalizadas, concebidas por pessoas do litoral, que não agregam ou melhoram a totalidade dos territórios, incluir os agentes das subpolíticas e a ciência local, é fundamental na criação de propostas legislativas, assim como grupos de trabalho locais que possam trabalhar em conjunto com os decisores, por exemplo o Ministério da Coesão Territorial. Descentralizar estes serviços também é fundamental, será esse o papel da regionalização, aproximar os serviços e trabalhadores aos territórios que não os têm, ou que os têm, mas com grandes défices. Dividir um território em regiões com características semelhantes, que já acontece, para promover o desenvolvimento equilibrado e melhorar a governança. Fatores como geografia, população, economia e cultura, a regionalização descentraliza a tomada de decisões e facilita políticas públicas específicas para cada região, reduzindo disparidades e promovendo coesão social e económica, promovendo uma equidade no que concerne ao acesso e aos direitos.

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