Destacamos, para começar, numa partilha de arte e de lazer, quatro filmes sobre marinhagem. Curiosamente, dois sobre marinhagem de rio e dois sobre marinhagem de mar.

Começamos com o absoluto clássico de Jean Vigo, L’Atalante, de 1934, com uma história de amor a bordo de uma barcaça de carga.

Continuamos com o muito mais recente Master and Commander, de Peter Weir, 2003, com Russel Crowe e Paul Bettany, passado durante as guerras napoleónicas, também em parte um chase movie que retrata de forma admirável a perseguição militar em alto mar e a vida nessas circunstâncias.

Depois, uma adaptação do mais significativo livro escrito sobre o mar seria também inevitável: optámos pela versão de Moby Dick de John Huston, de 1956, com Gregory Peck e também Orson Welles num papel secundário: descrever a busca obsecrada do capitão Ahab em torno de uma baleia é desnecessário pois toda a gente em geral conhece a história.

Por último, curiosamente também de Huston, The African Queen, de 1951, com Humphrey Bogard e Katherine Hepburn, também uma história de amor passada a bordo de uma barcaça de rio, na África durante a primeira grande guerra. Deixamos estas sugestões em que o calor da aventura marítima contrasta com a frieza e selvageria magistral do mar e das águas em geral.
Gostamos de agrupar unidades fílmicas sob muitos prismas diferentes — tema, objecto, género, cenário — e, hoje, também, escolhemos filmes unidos pelo acessório do camião e da cultura da camionagem. Muito incomum, segundo cremos, no cinema clássico — já existiam camiões ou, anteriormente, outros meios de transporte de bens em larga quantidade —, despontou em popularidade como cenário ou adereço a partir dos anos setenta. Porquê, não sabemos. Influências da crise do petróleo de então?
É importante notar, em primeiro lugar, que a disposição do homem e do seu veículo — como à semelhança de obras mais tardias dos anos oitenta, The Three Dukes e Knight Rider — são explicitamente versões do antigo western e da figura do homem e do seu corcel. São parte também do espírito americano não tanto de cavalaria tradicional, agregado a uma ordem, mas de independência social e económica.

Começamos assim com Smokey and the Bandit, de 1977, com Burt Reynolds e Jackie Gleason, retratando dois contrabandistas de cerveja, um ao volante de um camião e Reynolds ao volante de um lendário Pontiac Trans Am, em fuga do xerife, naturalmente interpretado por Gleason; nota-se neste filme o recurso entusiasmante a um adereço anteriormente indissociável do camionista, o do rádio CB, pequenos aparelhos a bordo do veículo que sintonizavam uma frequência específica à comunidade dos camionistas, e que, na película, ajudam os fugitivos.

De seguida, temos High Ballin’, de 1978, com Peter Fonda, temos o deboche de confronto entre camiões e respectivos condutores: uma máfia de grupo rival persegue dois protagonistas, todos ao volante do respectivo veículo. O filme é canadiano, terra familiarizada com o transporte de longa distância e com as paisagens agrestes, e contém várias sequências de perseguição automóvel muito interessantes.

Continuamos com White Line Fever, de 1975, na sequência dessa tal série de filmes sobre camionagem que tiveram o seu auge nessa década. É mais uma história de um camionista, regressado do Vietnam, em confronto com as máfias e os sindicatos que dominam a área. Muitas perseguições e algumas questões políticas.

A seguir, Duel, de Steen Spielberg, 1971. Um thriller absolutamente genial em que um automobilista anónimo, por razões completamente desconhecidas, começa a ser perseguido por um camionista, cuja identidade não é relevada e que se mantém sempre fora da vista, e também cujo camião teve a atenção estética de ser particularmente monstruoso e ameaçador. É uma das grandes películas do Spielberg inicial.

Uma penúltima entrada não é propriamente um filme sobre camionagem, mas achamos importante convocar pelo seu carácter de certo modo irmanado de um certo espírito de independência e aventura relacionado com a actividade. Trata-se de Big Trouble in Little China, de 1987, realizado por John Carpenter — também um mestre da independência e da aventura. O seu protagonista é um camionista, interpretado por Kurt Russell, com todos os tiques de cowboy do tipo, que, ao mesmo tempo, é um cómico anti-herói, atrapalhando-se em todas as suas iniciativas no cenário com que se depara: um complot de raptos, resgates e magia sobrenatural oriental, em plena chinatown, numa cidade na América.

E, por último, talvez o melhor para o fim: o muito precursor e europeu Le Salaire de la peur, de Henri-Georges Clouzot, com Yves Montand, de 1953, retratando um grupo de quatro irmãos contratados para conduzirem dois camiões carregados de nitroglicerina, com o objectivo de extinguirem um grave incêndio num poço de petróleo. Argumento explosivo, portanto e, segundo dizem, irrepreensível realização. São as nossas sugestões!