
Recordamos António Pereira Nobre (1867 – 1900), poeta decadentista – mas de uma fação do decadentismo longe das lamúrias Bernardinianas ou do coração arrítmico de Pessanha –, como o mais lusitaníssimo de verbo, um caso singular de entre os demais que partilharam com ele, sincronicamente ou não, desse sentimento que é a tristeza e do seu estado condescendente, a melancolia. A sua poesia é um suspiro, um alívio que sai de cima do peito fustigado; os olhos são de menino [in Menino e Moço] – fogem para a infância em Leça, Lixa, Póvoa e Trás-os-Montes –, para um ambiente burguês que, com efeito, experimentou, embora não o tenha definido; a mão que guiava a pena entristecia com a pátria presa na eterna convalescença financeira, moral e intelectual: e, contudo, como havia notado Fernando Pessoa, “(…) ele foi o primeiro a pôr em europeu este sentimento português das almas e das coisas ,que tem pena de que umas não sejam corpos, para lhes poder fazer festas, e de que outras não sejam gente , para poder falar com elas.” – por exemplo em “O meu cachimbo”: “Ó meu cachimbo! Amo-te imenso/ Tu, meu thuribudo sagrado! // Fumo? E ocorre-me à lembrança/ Todo esse tempo que lá vai (…)”.
De obra em vida, deixou-nos Só (1892) “que é o livro mais triste que há em Portugal!”, e postumamente Despedidas (1902), Primeiros Versos (1921), Alicerces (1983) – todo um corpus importante e memorável: Nobre foi o poeta finissecular do século XIX cujo decadente simbolismo transporta em si o retrato legítimo de uma aristocracia ingénua, porém, de um savoir-vivre Republicano e coevo, inclinado para a salutar paz de espírito que as moças portuguesas [in Purinhas] e animosas romarias lhe instigavam. A empresa de António Nobre, vale notar, culmina no rigor diletante dos seus versos, na métrica livre, no tom coloquial, em grande medida diarístico, que o deixa ser lido por todos. A sua poesia revela-nos um homem em luta com a morte, com a tuberculose, cujos fatos vão sendo de “pouca roda” para servirem no dia derradeiro [cf. Balada do Caixão]. Ainda almejou ir para Pretória na busca de ares mais secos e medicinais – infelizmente, esse sonho ficou por concretizar.
A grande súmula que podemos recordar é a de Pessoa, que com tanto carinho escreveu sobre Nobre – “Quando ele nasceu, nascemos todos nós. A tristeza que cada um de nós traz consigo, mesmo no sentido da sua alegria é ele ainda (…)”. Fica de mim, porém, o adeus, não o meu, mas o do poeta, que numa dimensão sempiterna soube dizer “Adeus! Eu parto, mas volto, breve// No meu regresso, que sol fará!” [in Adeus!].
(Para a redação deste artigo foram usados o Só, de António Nobre, e um artigo de F. Pessoa «Para a Memória de António Nobre»)